19/10/2007

Café Concerto (i)moral de Bruno Schiappa/Pedro Fontaínhas

"Avec le Temps"/ Com o Tempos

Conforme o tempo passa tudo passa. Esquecemos a cara, esquecemos a voz. O coração, quando bate mais, já não vai buscar mais longe. É preciso deixar de estar e está-se bem. Conforme o tempo passa tudo passa. Quem adorávamos, quem procurávamos à chuva, quem compreendíamos apenas através de um olhar de rodeio por entre palavras, por entre linhas e debaixo da pintura de um juramento maquilhado que segue a noite. Com o tempo tudo desmaia.
Conforme o tempo passa tudo passa. Mesmo as memórias mais queridas que temos de uma boca. Revisto a minha galeria nos raios da morte ao sábado à noite quando a ternura parte sozinha.
Conforme o tempo passa tudo passa. Em quem acreditávamos por dá cá aquela palha. A quem dava-mos vento e jóias, por quem teríamos vendido a alma por alguns tostões. Em frente a quem nos treinávamos como se treinam os cães. Bem, de facto, conforme o tempo passa, tudo passa.
Conforme o tempo passa tudo passa, esquecemo-nos das paixões e esquecemo-nos das vezes que nos diziam baixinho as palavras das pobres gentes: não venhas muito tarde e sobretudo não apanhes frio.
Conforme o tempo passa, e sentimo-nos embranquecidos como um cavalo velho e sentimo-nos gelados num leito de ocasião e sentimo-nos sozinhos, talvez, mas penosos, lesados pelos nossos perdidos.
Bem, de facto, com o tempo, deixamos de amar.

Texto:Leo Ferré

Fotogarfia: Maria Flores

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